Dezembro Laranja

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Dezembro Laranja: após isolamento, volta à exposição ao sol exige mais cuidados

Campanha Dezembro Laranja

Depois de um longo período de isolamento, muitas pessoas estão voltando para encontros com familiares e amigos, atividades ao ar livre, viagens, passeios de férias, aproveitando o verão na praia. Os cuidados com a proteção continuam e não devem ser apenas com a transmissão da Covid-19, como destaca a campanha deste ano do Dezembro Laranja da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), com o slogan “Adicione mais fator de proteção ao seu verão”.

“As pessoas precisam aproveitar o momento para entender que proteção não é só prevenção ao coronavírus, mas também cuidados para prevenir o câncer de pele”, ressalta o dermatologista Elimar Gomes, vice-presidente da SBD-SP.

Ele destaca que o fato de muitas pessoas terem reduzido a exposição ao sol nos últimos dois anos deixou as peles mais claras e desprotegidas. “Não adianta pensar que no primeiro dia de praia vai ficar bronzeado, porque não vai. Vai queimar. Esse ano há muita chance de ter queimaduras, porque estava todo mundo fechado dentro de casa, voltando com sede ao pote”, avalia Gomes, comentando que atendeu no consultório um médico de mais de 70 anos que teve queimadura – e nunca tinha ficado queimado durante toda a vida -, porque estava com baixíssima exposição, foi viajar com a família para a praia e não se cuidou devidamente.

“A pigmentação ajuda a proteger um pouco e como as pessoas não estão nada bronzeadas não têm pigmentos e se expõem mais facilmente a queimaduras”. Por conta dessa situação especial, a recomendação é utilizar nesse momento um fator de proteção maior. “Sempre recomendamos usar fator 30 ou mais. Se puder usar um fator maior, pelo menos nesse começo, será melhor”.

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Proteção todo dia

Quando se trata de prevenir o câncer que é mais incidente em todo o país – o câncer de pele não melanoma (que se divide em carcinoma basocelular – menos agressivo e mais frequente, 70% dos casos – e espinocelular, 10%), que corresponde a cerca de 30% de todos os tumores malignos, conforme o Instituto Nacional de Câncer (Inca) -, ainda há desinformação e falta de ação. O dermatologista acredita que as campanhas contínuas possibilitaram às pessoas saber mais o que é preciso para prevenir a doença, mas a maioria ainda vincula o uso do protetor apenas à exposição nos momentos de recreação e não adota uma rotina diária.

“Sabemos que a rotina de proteção solar é importante e vai reduzir danos crônicos que acontecem todo dia. A grande maioria dos cânceres de pele está nas áreas mais expostas, como o rosto”, avisa.

A proteção para atividades externas é similar à indicada para quem está no lazer, por exemplo, que é a aplicação de uma camada de protetor solar com pelo menos fator 30 nas áreas expostas ao sol, com reaplicação a cada 2 a 3 horas – ou, para quem está na praia ou piscina, proteção no corpo inteiro, de preferência com um fator de proteção mais alto, e repassar quando sair da água.

 

Proteção fora e dentro de casa

Com a limitação de deslocamento, aumento do trabalho home office e do período dentro de casa, grande número de pessoas buscou ambientes iluminados pela luz natural para trabalhar, relaxar e passar uma parte do dia. O que muita gente não sabe é que dependendo do grau da iluminação que existe dentro de casa ou no escritório, também é necessário proteger a pele da luz solar. “A radiação UVB, que provoca queimadura e é a principal causadora do câncer de pele, não atravessa os vidros. Mas não podemos esquecer que a radiação ultravioleta do tipo A atravessa os vidros e penetra um pouco mais profundo na pele; é a principal causadora do envelhecimento da pele e também tem efeito imunossupressor, diminuindo as defesas da pele”, comenta Gomes.

Por isso, para quem fica em um ambiente muito iluminado, perto de janelas, a indicação é utilizar protetor solar nas áreas expostas; quem tem a pele mais morena precisa escolher um produto que além da proteção UVB e UVA tenha também pigmento, para proteger da luz visível e evitar o melasma, já que essa luz causa aumento de pigmentação em pessoas com esse tipo de pele. “Muitos pacientes, para evitar a sensação de estar preso dentro de casa, começaram a trabalhar perto da janela e tiveram piora de melasma, aquela mancha de pele que é relacionada a qualquer tipo de luz visível”.

Ele acrescenta que, diferentemente do que se acreditava anteriormente, o UVA pode ter impacto no desenvolvimento do tumor à medida em que reduz a imunidade da pele, e pelos processos de estresse oxidativo, com a formação de radicais livres que podem ajudar na progressão deste tipo de câncer.

Enquanto a incidência do UVB é maior entre 9 horas e 15 horas – por isso as recomendações de evitar exposição prolongada entre esses horários -, o UVA é igual o dia todo; a partir do momento que amanhece já há uma dose alta de radiação ultravioleta do tipo A e por isso é importante, para quem fica exposto à luz visível, dentro de um ambiente fechado ou em ambiente aberto, incluir o protetor na rotina matinal.

Gomes afirma que as pessoas precisam entender a necessidade da proteção diária – de passar o protetor solar logo pela manhã, com um produto adequado ao tipo de pele, escolhido de preferência junto com o dermatologista – e da proteção no momento de alta exposição.

 

Diagnóstico atrasado

A pandemia não afetou apenas o nível de exposição ao sol, mas também provocou um retrocesso nos diagnósticos, porque muitas pessoas não passaram por consulta com dermatologista para acompanhar as pintas. “Vimos aumento do número de casos de câncer de pele mais avançados. A SBD fez um levantamento da quantidade de biópsias de pele realizadas em 2020 e houve uma queda grande em relação aos anos anteriores. O número de tumores não diminui de um ano para outro. Estamos recebendo pacientes que passaram um ano a mais com os tumores progredindo, diagnósticos mais tardios, com lesões um pouco maiores e comprometimento um pouco mais profundo na pele”, alerta o dermatologista. “Para o melanoma isso tem um impacto muito grande. A cada milímetro de profundidade que ele vai penetrando na pele há piora do prognóstico”.

Para reverter essa situação, ele sugere que as pessoas prestem atenção nas lesões e revisem todas as pintas. Quem está há muito tempo sem fazer check up dermatológico, principalmente se tem alto risco (com pele, olhos e/ou cabelos claros, com muitas pintas e principalmente com histórico familiar), deve fazer uma checagem geral.

 

Boas notícias no tratamento

Se por um lado o último ano registrou piora no diagnóstico, por outro houve importante avanço no tratamento. O oncologista Gustavo Schvartsman, do Hospital Israelita Albert Einstein, esclarece que no carcinoma basocelular, o mais comum no mundo, felizmente a maior parte acontece de forma localizada e é removida com cirurgia. Entretanto, pontua, como há um número muito grande de casos, acaba havendo também uma quantidade significativa de pacientes com a doença mais agressiva, com recidiva, e com menor frequência pacientes com metástase.

Além do tumor localizado, há casos em que a doença aparece localmente avançada, às vezes de forma que não é possível realizar cirurgia, como exemplifica o oncologista, em situações em que está invadindo alguma estrutura que confere irressecabilidade (quando a remoção do tumor provavelmente causaria mais danos do que benefício ao paciente), por exemplo, invadindo o globo ocular de forma que para a cirurgia seria preciso remover o olho, quando invade a região do cérebro ou algum vaso importante. “São cirurgias que funcionalmente deixariam um dano muito grande e por isso acabam não sendo a melhor alternativa, ou porque não será possível fazer, ou porque o paciente recusa por já ter feito múltiplas ressecções”.  Schvartsman cita que há ainda o tumor que deu metástase e não adianta fazer cirurgia porque a doença já se disseminou e será necessário tratamento sistêmico.

“Nesse contexto do tratamento sistêmico, o que temos como primeira linha, primeira opção de tratamento, é um inibidor de uma via de crescimento do carcinoma basocelular (via hedgehog). O vismodegib bloqueia essa via, com ótimas taxas de resposta e muitas vezes respostas duráveis. Mas é um medicamento difícil de tolerar, porque tem muito efeito colateral. Muitas vezes o paciente para de tomar porque a doença voltou a crescer, aprendeu a contornar os mecanismos que o remédio está bloqueando, ou porque o paciente não aguenta mais tomar”, esclarece o oncologista.

Além dessa terapia-alvo, foi aprovado no início deste ano no Brasil um tratamento imunoterápico, o cemiplimab, como segunda opção para carcinoma basocelular localmente avançado ou com metástase, para pacientes que foram refratários ao vismodegib porque a doença progrediu ou porque o organismo foi intolerante ao medicamento. “Entra uma questão um pouco subjetiva, porque às vezes um paciente muito idoso ou que sabemos de antemão que não vai aguentar a terapia-alvo por causa do perfil de efeito colateral, é um paciente que talvez possamos considerar candidato à imunoterapia logo de início, mas não é o tratamento em bula de primeira opção; é o de segunda linha”.

Essa imunoterapia é endovenosa e está disponível no sistema privado, para os pacientes que têm plano de saúde, mas não tem no Sistema Único de Saúde (SUS).

A análise dos resultados desta opção imunoterápica, avisa Schvartsman, leva em conta que são pacientes com doença bastante avançada, o tratamento padrão falhou e a doença é resistente. “A taxa de resposta nesse contexto é geralmente mais baixa. Nesse caso, a taxa foi de 30%, ou seja, em 30% dos casos o tumor respondeu significativamente – com pelo menos 30% de redução do seu volume”, diz. “Temos mais cerca de 30% a 40% dos casos em que a doença ficou estável, ou seja, parou de crescer, mas não suficiente para ser chamada de resposta objetiva, porque não chegou a 30%. É um benefício clínico para o paciente porque se a doença não continuou crescente, consideramos um resultado satisfatório. São pacientes que não tinham outra opção de tratamento e agora pelo menos em 30% dos casos temos uma boa resposta”.

Esse mesmo medicamento, o cemiplimab, desde dezembro de 2019 já estava aprovado no país para uso no carcinoma escamoso de pele, como primeira opção de tratamento.

 

Melanoma, uma jornada de desafios

“Eu entendo que quando a gente tem um diagnóstico de câncer é como se Deus tivesse dado uma missão. Para mim ficou muito clara a missão de ajudar pacientes com câncer. É um prazer enorme fazer o que faço”. Assim a advogada Carla Gil Fernandes, 45 anos, conta a motivação de construção da sua jornada, que começou com um grande susto no diagnóstico de melanoma e a levou a ser, há dois anos, a vice-presidente do Instituto Melanoma Brasil.

Sua história como paciente começou em 2017, quando recebeu diagnóstico de melanoma em estágio 3 com a biópsia de uma pinta que tinha nas costas havia muitos anos. “Eu já tinha efetuado a retirada umas duas ou três vezes na adolescência, mas depois de alguns anos ela voltava. Nessas vezes foi para biópsia e não era melanoma. Em 2017 ela voltou, começou a me incomodar, tirei e veio esse diagnóstico assustador de melanoma bem profundo, metastático. Foi um choque”, lembra.

Encaminhada para um oncologista, fez vários exames de imagens que identificaram duas metástases no pescoço. Passou por cirurgia, onde realizou esvaziamento cervical de todos os gânglios do pescoço e começou tratamento com imunoterapia em uma pesquisa clínica. “Na época eu estava sem convênio médico, fiz todo tratamento via SUS e consegui entrar em um protocolo clínico de tratamento com ipilimumab, um imunoterápico um pouco mais antigo”, recorda. “O tratamento não deu certo, a doença progrediu e eu saí da pesquisa. Apareceu metástase no linfonodo da axila direita e fiz outra cirurgia em 2018, esvaziando esses linfonodos”.

O médico sugeriu que ela continuasse com imunoterapia, trocando o medicamento. Como não havia pesquisa aberta nem disponibilidade dessa opção pelo SUS, Carla, que é especialista em Direito Médico da Saúde, requereu a medicação via processo judicial. “Judicializei contra o Estado porque estava em um estágio superavançado. Era isso ou eu não tinha opção. O médico avisou que precisaria buscar outra alternativa porque pelo SUS meu tratamento seria acompanhar, aparecer metástase novamente, tirar, aparecer outra, tirar, uma vida de cirurgias até o momento em que apareceria em um lugar inoperável, porque a quimioterapia que o SUS oferece não é eficaz quando o caso está muito avançado, muito agressivo”.

Durante dois anos a paciente fez tratamento com nivolumab, que terminou em 2020. Desde esse momento faz acompanhamento a cada três meses, revezando tomografia de corpo inteiro com ressonância de crânio e PET-scan; a cada seis meses realiza mapeamento de pintas do corpo inteiro. “Estou em remissão, sem sinal de doença ativa”, comemora.

No início o acompanhamento era feito também pelo Sistema Único de Saúde e nesse período ela ingressou em um plano de saúde, cumpriu as carências e hoje faz os exames pelo convênio.

Participando de um grupo no Facebook para pacientes e familiares de melanoma, começou a compartilhar a difícil jornada de se ver diante de um diagnóstico tão desafiador e ainda precisar buscar na Justiça o direito de ter um tratamento eficaz. “Quando o primeiro quimioterápico não fez efeito, foi mais difícil do que receber o diagnóstico. Pensei: meu Deus, agora vou ter que judicializar, não sei se vou conseguir, não tem mais remédio no SUS para mim”.

Sua experiência como advogada especializada em saúde, aliada à vivência como paciente, possibilitou que ajudasse muitos outros pacientes em suas angústias e dúvidas, com dicas e orientações. Ela conta que começou a militar pelos pacientes, até que um dia recebeu uma ligação da presidente do Instituto Melanoma Brasil com um convite para ser a vice-presidente da entidade, ao qual aceitou de pronto, com grande alegria.

 

Uma grande luta

Em meio a muitas batalhas para melhorar a situação dos pacientes, Carla revela a atual luta para melhoria das políticas públicas para a doença: depois de uma campanha para que a imunoterapia fosse incorporada no SUS para tratamento de melanoma avançado, após diversas fases na Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) foi definida a incorporação de dois imunoterápicos no sistema público: nivolumab e pembrolizumab. Com o parecer da Conitec favorável à incorporação publicado em agosto de 2020 no Diário Oficial, por lei o Ministério da Saúde teria seis meses para disponibilizar esses medicamentos nos hospitais públicos, ou seja, desde fevereiro deste ano os pacientes que atendem às condições deveriam receber essas imunoterapias.

“Os medicamentos ainda não estão disponíveis. Fizemos reuniões com o Ministério para saber o que houve, o que está atrasando, em que fase está o processo e por que os imunoterápicos não foram comprados”, informa a advogada, acrescentando que para a aquisição é necessário primeiro atualizar as Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT) do melanoma e o valor de repasse de recursos para os hospitais, a Autorização de Procedimento de Alta Complexidade (Apac). Segundo Carla, a promessa era sair no máximo até dezembro, mas ainda não aconteceu. “É desesperador, porque atualmente o paciente com doença avançada tem duas opções: judicializar ou vir a óbito, e a judicialização também não é rápida, o paciente espera no mínimo três meses para conseguir o remédio, alguns esperam seis, oito meses. Três meses já é muito tempo porque a doença é agressiva, avança rapidamente”, lamenta.

Por conta dessas dificuldades, a vice-presidente da entidade reforça a necessidade de cuidados de prevenção para evitar o câncer de pele. “As pessoas não sabem o que é melanoma e o quanto é grave. Para se proteger do melanoma precisa se proteger do sol, porque é um dos fatores que pode desencadear o desenvolvimento desse tumor”.

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